Conto: New York

Eu estava de mudança. Finalmente sairia da casa dos meus pais para morar no lugar onde eu sempre sonhei em viver. New York. Era um lugar i...


Eu estava de mudança. Finalmente sairia da casa dos meus pais para morar no lugar onde eu sempre sonhei em viver. New York. Era um lugar incrível e certamente eu me daria bem lá. Por sorte, meu inglês era fluente e eu conseguiria arranjar um bom emprego. A casa que eu alugara era pequena, mas bonita. Se localizava no centro e era perto das lojas e restaurantes.

Depois da viagem do avião, peguei um táxi e cheguei à casinha. Era espaçosa. Coloquei minhas malas em cima da cama e comecei a arrumar as roupas no armário. Seria um dia corrido. Eu precisava estar pronta às 19 horas para a entrevista com o gerente da loja de brinquedos em que eu iria trabalhar, precisaria comprar uma roupa nova e bonita para a reunião, tomar um banho e arrumar meu cabelo. Nada que fosse impossível.

Quando tudo já estava arrumado, saí de casa para andar pelas ruas. Era tudo muito lindo e organizado. As pessoas andavam apressadas enquanto eu observava tudo com atenção. A paisagem toda era chamativa e prendia meu olhar. Nas vitrines, eu procurava um vestido comportado e social até que encontrei o que eu estava esperando. Bege e curto, o vestido levava uma certa galância que eu achei ideal para o momento.

Após compra-lo, voltei para casa com o objetivo de me arrumar. Tomei banho, arrumei meu cabelo e quando vi o relógio quase já marcava a hora de sair. Vesti meu sapato e saí correndo. A sorte era que o restaurante era perto. Entrei no local e senti o cheiro delicioso de comida e percebi que ainda não tinha comido desde que descera do avião. Na mesa reservada, ali estava o homem de terno e gravata que me esperava.

Preparei-me para começar a falar inglês e não gaguejar, e com um sorriso de desculpas, sentei-me à mesa.

- Não se preocupe. Você bebe vinho tinto? Vou pedir um para nós dois. – e levantou a mão para chamar o garçom – Quero o melhor vinho da casa. E você pode nos conseguir um Menu?

O garçom assentiu anotando no seu bloquinho, deixou na mesa dois Menus e foi embora. O homem sentado à minha frente abriu o caderno de opções para janta e eu comecei a observá-lo. Era bastante informal, pelo que parecia. Sua barba bem feita escondia seu sorriso de dentes tortos. Seu cabelo já devia ter começado a cair há algum tempo e em grande parte já estava ficando branco.

Escolhi um prato leve e começamos a conversar. Tudo foi tranquilo. Ele disse que gostara de mim e que eu me encaixava com o cargo que eu escolhera. Feliz, voltei à ruazinha deserta e me preparei para dormir. Fora um dia corrido, mas pelo menos eu começaria a trabalhar no dia seguinte e aquilo era uma ótima notícia. Fechei os olhos e adormeci.

Foi difícil me convencer que aquilo era verdade. Sim, eu estava em nada menos que New York e aquele sonho realmente estava acontecendo. Eu estava me levantando para ir ao meu trabalho e receberia meu primeiro salário no fim do mês. Como era maravilhoso imaginar que tudo isso seria capaz de acontecer em tão pouco tempo.

Ao chegar na grande loja no centro da cidade, fui recebida por alegres colegas de trabalho que cantarolavam e vendiam brinquedos para crianças risonhas e felizes que compravam sem parar. A loja tinha diversos brinquedos diferentes e gostos para todas as crianças de diferentes idades. Eu coloquei o avental vermelho e ouvi alguém chamar engraçado meu nome, com um sotaque inglês.

- Eliana!

Olhei para trás e vi um garoto correndo em minha direção. Esperei por ele e sorri. Como ele sabia meu nome? Não importava. Algumas sardas engraçadas cobriam suas bochechas e nariz. Quando chegou ao meu alcance, sorriu também, ainda meio ofegante pela corridinha.

- Oi? – comecei a conversa, tentando ser simpática.

- Soube que você é a estrangeira nova no trabalho. Seja muito bem-vinda!

Seu largo sorriso iluminou meus olhos. Agradeci e olhei seu crachá pendurado em seu avental da mesma cor que o que eu vestia. Joe. Ele mantinha aquele sorriso fofo no rosto e eu levantei as sobrancelhas. Okay, o que deveria acontecer em seguida? Eu deveria seguir e começar a trabalhar ou puxar assunto com o novo colega? Certo. Eu era a novata. Ele devia me entreter e não eu entreter ele. Afastei os pensamentos ridículos com uma risadinha abafada.

- Se você precisar de ajuda, me procure. – disse e apontou pro seu crachá, o qual eu já havia lido.

Assenti, agradeci novamente e ele seguiu em direção à outra colega que tinha cabelos descoloridos e uma porção de tatuagens esquisitas. Dei de ombros e peguei a primeira pilha de bonecas para organizar nas prateleiras. Não era difícil, porém chato. Para agradar o ambiente da loja, alguns funcionários colocaram algumas músicas para a minha alegria. Dançando na batida da música, terminei tudo em pouco tempo.

Logo já era hora do almoço. Tirei meu avental e peguei minha bolsa para sair em busca de um restaurante quando alguém segurou meu braço. Não era de se surpreender quando vi o rosto bonito de Joe sorrindo. Ele era rápido.

- Vamos almoçar juntos. Eu sei um lugar ótimo para comer.

Acompanhei-o pelo centro e então chegamos em frente à uma bonita, mas simples fachada onde entramos para encontrar um lugar bom para sentar e comer. Eu não estava faminta, pedi um prato pequeno e esperei. O garoto cruzou os braços sobre a mesa e ficou me olhando por alguns minutos. Sem saber o que dizer e fazer, dei um sorriso até que ele iniciou a conversa.

- Seu inglês é bom. Não pensei que fosse...

- Brasileira. Sou do Brasil. – respondi – Obrigada, venho treinando há um bom tempo porque sempre foi um sonho morar aqui.

- Que interessante. Não pensei que as brasileiras fossem tão bonitas.

Com uma risadinha, virei o rosto para esconder as bochechas rosadas. Ele estava se interessando por uma brasileira. Existiam tantas inglesas bonitas e... Abaixei os braços em cima do colo e dei mais uma olhada para o garoto. Tudo bem. Ele era realmente bonito. Não era de se desperdiçar. Simpático, educado, engraçado, inglês... Seus olhos azuis encontraram os meus castanhos e percebi que brilhavam de ansiedade.

Sem saber o que falar, esperei ele pensar numa próxima cantada.

- Como é o Brasil?

Surpresa com a pergunta, dei um sorriso.

- Ah, é bonito, mas bastante movimentado, muito calor, nenhuma neve... Como disse, prefiro tudo aqui. É muito melhor.

- Que bom que escolheu ficar com a gente. Sinta-se em casa e quando precisar de ajuda, conte comigo. Estarei sempre aqui, disposto a resolver qualquer problema.

- Nunca pensei que seria recepcionada tão bem. Os ingleses costumam não gostar muito da gente, pelo que ouvi falar. Me sinto mais tranquila em saber que você me acolheu e...

Antes que eu conseguisse pensar em completar a frase, Joe me surpreendeu. Por cima da mesa, ele segurou meu rosto e nos beijamos. O momento foi único e tenso. O silêncio não me deixou com medo ou parou no tempo. Simplesmente agi naturalmente e o beijei novamente, correspondendo automaticamente. Sorrimos juntos e percebi que aquela noite seria longa.

Sim, eu estava sentindo atrações por um inglês. Ele havia me beijado e me largado em casa depois de termos jantados juntos. Parecia uma rotina. Na semana seguinte fora praticamente igual. Saíamos juntos para olhar um filme, andar no parque, comer algodão-doce e andar de bicicleta.

Até a semana em que ele começou a ficar quieto demais, longe demais de mim. Não contava o que estava fazendo, faltava alguns dias de trabalho e sem justificar nada, sumia sem avisar. Estava acontecendo alguma coisa que me deixava preocupada. Não deixava nenhum recado muito menos atendia as minhas ligações.

Ninguém tinha sinal dele. Quase um mês se passara e eu ainda não tinha notícias. Chegando num final de semana em que eu estava super cansada, cheguei em casa e sentado no sofá estava Joe. Larguei minha bolsa sobre a mesa da sala de jantar e fiquei de pé em sua frente. Ele sorriu timidamente, pedindo desculpas. Como se eu pudesse desculpá-lo depois de tudo aquilo.

- Quero que não fique brava comigo. Só deixe-me dizer uma coisa, por favor. – então ele se levantou, segurou meu rosto e fixou seus olhos nos meus para dizer, em português, o que me fez decidir ficar para sempre ali – Eu te amo.

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